Por Alexandre Fuchs das Neves
A Duplicata Escritural, introduzida no nosso meio jurídico pela Lei 13.775/18, tem por objetivo claro nascer, viver e encerrar seu ciclo econômico-produtivo no ecossistema protegido e regulado das intraestruturas do mercado financeiro, com segurança cibernética, operacional e jurídica.
Todo o ciclo é controlado pela intraestrutura eleita para a escrituração da duplicata, que basicamente irá praticar os atos de saque, transferência de titularidade, atos cambiais (aval por exemplo) e apresentação ao sacado para cobrança, dentre outros.
Tudo somente poderia acontecer, nos termos do art. 4º da Lei 13.775/18, dentro do sistema eletrônico, ou seja, sem interferência humana no ciclo de vida da duplicata escritural.
E um dos mais conturbados temas do titulo de crédito em comento, a duplicata, seja ela escritural ou física, é justamente a prova da entrega e recebimento das mercadorias e serviços, considerando que a Lei das Duplicatas não traz, claramente, qual seja esta prova.
O mercado, por décadas, usou o canhoto da nota fiscal devidamente assinado, mas este meio gerou milhares de demandas, com decisões diversas, gerando insegurança jurídica e instabilidade negocial para este titulo de crédito de enorme importância para a indústria e o comércio.
Ainda, outras ferramentas de confirmação, tais como o e-mail, a ligação telefônica gravada e, ultimamente, soluções extremamente frágeis como o uso de plataformas de comunicação instantânea (whatsapp ou telegram, por exemplo), são usadas, com proporcional risco jurídico, para tentar realizar esta prova, cuja validade fica ao alvedrio do Julgador – exatamente porque a Lei, até então, não trazia o forma de como realizar a prova.
Então, coube ao legislador determinar que as evidencias digitais também abrangerão a prova da entrega e recebimento das mercadorias e serviços, o que está previsto na Lei 13.775/18, no art. 4º, § 3º O sistema eletrônico de escrituração de que trata o caput deste artigo disporá de mecanismos que permitam ao sacador e ao sacado comprovarem, por quaisquer meios de prova admitidos em direito, a entrega e o recebimento das mercadorias ou a prestação do serviço, devendo a apresentação das provas ser efetuada em meio eletrônico.
A importância das evidências digitais evoluíram quando da MP 1051/21, que criou o Documento Eletrônico de Transporte, DT-e, que é exclusivamente digital, de geração e emissão prévias obrigatórias à execução da operação de transporte de carga no território nacional.
Seguindo os marcos regulatórios sobre o tema, foi alterada no dia 7 de janeiro de 2022 pela Lei 14.301/22, a Lei das Duplicatas, (5.474/68) que agora passa a considerar as evidencias de entrega e recebimento das mercadorias e serviços pelo meio eletrônico, sendo que a Lei das Duplicatas passa a ter a seguinte redação:
Art 15 – A cobrança judicial de duplicata ou triplicata será efetuada de conformidade com o processo aplicável aos títulos executivos extrajudiciais, de que cogita o Livro II do Código de Processo Civil, quando se tratar:
l – de duplicata ou triplicata aceita, protestada ou não
II – de duplicata ou triplicata não aceita, contanto que, cumulativamente:
- a) haja sido protestada;
- b) esteja acompanhada de documento hábil comprobatório da entrega e do recebimento da mercadoria, permitida a sua comprovação por meio eletrônico; (Redação dada pela Lei nº 14.301, de 2022)
- c) o sacado não tenha, comprovadamente, recusado o aceite, no prazo, nas condições e pelos motivos previstos nos arts. 7º e 8º desta Lei.
A regulamentação, tanto da MP 1051/21 quanto da alteração da Lei das Duplicatas depende ainda de ato do Poder Executivo Federal para sua plena validade, mas a depender dos largos passados que o assunto tem dado, possivelmente antes do encerramento do semestre já teremos a finalização do desenho legal a comprovação pelo meio eletrônico da entrega e recebimento das mercadorias e serviços.
Esta ferramenta encerra mais um ciclo da duplicata escritural, quando aponta para a evidência de entrega e recebimento da mercadoria previsto a MP 1051/21, onde existe a presunção nos termos do seu art 2, inciso VII: encerramento de DT-e – o evento registrado no DT-e emitido que indica a conclusão do serviço de transporte.
E aos mais atentos ao tema, resta claro que este desenho será o empoderamento do sacador da duplicata escritural, que terá um recebível completamente higienizado, podendo obter por ele um preço melhor no momento da venda.
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